Se você come ovo todos os dias ou conhece alguém que não fica sem um ovo cozido, talvez se interesse por esse novo artigo que trouxe o ovo de volta às manchetes de jornais com a pergunta: Ovos são vilões do colesterol e das doenças do coração?
Esta discussão ressurgiu devido a um artigo publicado recentemente, que mostra uma associação entre o consumo de 3 a 4 ovos por semana e o aumento do risco de doenças do coração em 6%. O artigo também mostrou associação entre o consumo de 300mg de colesterol por dia e aumento do risco de doenças do coração em 17% (1). Entretanto, estudos anteriores não encontraram associação entre o consumo de 1 ovo por dia e doenças cardiovasculares em pessoas saudáveis (2,3,4)!
E agora, em qual estudo acreditar?

Analisando os dados, podemos ver pontos positivos e negativos deste novo estudo:
POSITIVO: Este artigo utilizou dados individuais de quase 30 mil pessoas, o que dá um maior poder de análise.
NEGATIVO: Os dados de alimentação foram coletados apenas uma vez em até 30 anos antes da doença cardiovascular, isto é, muita coisa pode ter acontecido entre o consumo e a doença (apesar dos autores tentarem estatisticamente considerar tais aspectos).
Outros aspectos importantes são:
Este tipo de estudo não analisa causa e efeito, apenas associação. Associação é quando dois fenômenos são simultâneos, mas não necessariamente causam um ao outro. Por exemplo, tem mais acidente de carro quando há mais guarda chuvas nas ruas, isto é, guarda chuva e acidente de carro são associados, mas o guarda chuva não causa o acidente de carro.
Assim como neste estudo não se conclui que ovo causa doenças cardiovasculares.
A relação entre quantidade de colesterol consumido na dieta e de colesterol no sangue varia de pessoa para pessoa. Isto é, algumas pessoas reagem à quantidade de colesterol consumida aumentando colesterol sanguíneo, e outras pessoas não, dependendo de fatores genéticos e metabólicos individuais (5,6)!
Assim, temos que olhar com cuidado esses achados.
Um único alimento não é o vilão da alimentação. Se a pessoa não consome ovo, mas consome altas quantidades de carne vermelha (que tem grandes quantidades de gordura saturada) e cereais refinados, como arroz branco, macarrão ou pão branco (que não possuem fibras e rapidamente aumentam a glicose do sangue), provavelmente não terá menor risco de doenças do coração do que a pessoa que consome ovo.
A quantidade, frequência de consumo e o modo de preparo (frito, com muito óleo, sal, presunto ou bacon) fazem a diferença!
Em resumo, considerando os diversos estudos publicados e recomendações nacionais e internacionais, estes novos achados não são suficientes para mudar o conceito que já tínhamos do ovo. Assim, se você ou seu amigo é fissurado em ovo, o consumo de até 1 ovo por dia provavelmente não aumentará risco de doenças do coração, e ainda fornecerá várias vitaminas e compostos antioxidantes (6,7). Lembrando que esta recomendação é para pessoas saudáveis, sem diabetes ou outras doenças associadas!
Seguem os artigos para consulta:
1. Zhong VW, Van Horn L, Cornelis MC, et al. Associations of Dietary Cholesterol or Egg Consumption With Incident Cardiovascular Disease and Mortality. JAMA 2019; 321(11): 1081–1095.
2. Hu FB, Stampfer MJ, Rimm EB, et al. A prospective study of egg consumption and risk of cardiovascular disease in men and women. JAMA. 1999;281:1387-94.
3. Fernandez ML. Dietary cholesterol provided by eggs and plasma lip
oproteins in healthy populations. Curr Opin Clin Nutr Metab Care. 2006;9:8-12.
4. Shin JY, Xun P, Nakamura Y, He K. Egg consumption in relation to risk of cardiovascular disease and diabetes: a systematic review and meta-analysis. Am J Clin Nutr. 2013;98:146-59.
5 Kratz M. Dietary cholesterol, atherosclerosis and coronary heart disease. Handb Exp Pharmacol. 2005;(170):195-213.
6. Faludi AA, Izar MCO, Saraiva JFK, Chacra APM, Bianco HT, Afiune Neto A et al. Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose – 2017. Arq Bras Cardiol 2017; 109(2Supl.1):1-76.
7. Santos RD, Gagliardi AC, Xavier HT, Magnoni CD, Cassani R, Lottenberg AM, et al; Sociedade Brasileira de Cardiologia. First guidelines on fat consumption and cardiovascular health. Arq Bras Cardiol. 2013;100(1 Suppl 3):1-40.
Por Aline Martins de Carvalho
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