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“Não dar entrada num hospital não quer dizer que a pessoa não passou fome”, afirma Patrícia Jaime em matéria, questionando premissa de Figueiredo do Ipea

Em depoimento à Folha de S. Paulo, a professora Patrícia Constante Jaime, vice-diretora da Faculdade de Saúde Pública da USP, questiona o documento assinado por Erik Alencar de Figueiredo, presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em que o instituto contesta dados sobre o crescimento da insegurança alimentar e da fome no país.

Apresentado no último dia 17 pelo Ministério da Cidadania, a nota do Ipea traz suposições de que a fome não teria aumentado no Brasil durante o governo Bolsonaro. A divulgação do documento causou polêmica e foi veementemente contestado por diversas instituições e personalidades científicas, incluindo a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) – leia nota de repúdio da Abrasco aqui -, além do Grupo de Pesquisa Nutrição e Pobreza do Instituto de Estudos Avançados da USP (leia aqui o manifesto dos pesquisadores do IEA-USP).

De acordo com o 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, elaborado pela Rede Penssan (Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional), existem no Brasil 33 milhões de pessoas passando fome atualmente, o que representa um retrocesso de mais de 30 anos das políticas de proteção social. A Rede Penssam elaborou o relatório a partir de pesquisa executada pelo Instituto Vox Populi.

O documento do Ipea se baseia em dados de internações hospitalares. Para a professora Patrícia, que também é vice-coordenadora científica do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens-USP), a premissa é questionável porque os números de internação não servem para estimar dados de desnutrição e fome, “já que não dar entrada num hospital não quer dizer que a pessoa não passou fome”.

A matéria assinada por Fernanda Brigatti foi publicada no dia 22 de agosto na seção Mercado. No texto, a professora mostra que no que diz respeito à insegurança alimentar, “a forma mais grave é a fome e o impacto na saúde leva um tempo para acontecer”, afirmou.

A professora explicou que “a desnutrição tem um efeito cumulativo sobre a saúde, especialmente no desenvolvimento infantil até os cinco anos de idade. Por isso, quando uma criança é admitida em um hospital, é comum que o primeiro diagnóstico seja uma desidratação por diarreia ou uma infecção respiratória, por exemplo. Somente depois é que a origem relacionada à desnutrição será identificada”, disse.