CPaS-1 – Coletive de Pesquisa em Antropologia, Arte e Saúde Pública

Tezão na Epidemia

Em tempos de pandemia, a busca por entretenimento (na posição de isolamento) se mostra ampla. Com uma alta demanda, os sites pornográficos adotam medidas para reforçar e instigar o confinamento, fazendo com que pessoas que trabalhem com sexo busquem vender sua imagem de forma virtual, sem exposição física. Texto de Michel Furquim.

Imagem disponível em <Tinder | Man of Many> . Acesso em 01/12/2021

Durante as crises mundiais alguns setores na economia ampliam seus lucros, como foi o caso do chocolate M&M’s na II Guerra Mundial, e com a pandemia do Covid-19 não seria diferente.

Como medida para conter o avanço das contaminações com o novo coronavírus, a Organização Mundial da Saúde recomendou o isolamento social para todas as pessoas, evitando assim a circulação do vírus em mais locais e o colapso nos sistemas de saúde. Neste período de quarentena, muitos precisaram mudar suas rotinas, adotando o home office como alternativa para algumas profissões, aulas à distância, cursos online e até atividades culturais através das lives das redes sociais. Mas o que tem ocupado a rotina de muitos brasileiros são as visitas em sites pornôs.

Segundo o site SexyHot, houve um aumento de 31% nos acessos em sua plataforma, entre 14 a 19 de março. O site Brasileirinhas, teve um aumento em seus números, duplicando a quantidade de assinantes na semana do dia 15 de março.

Outro site de conteúdo adulto, o PornHub, além de ter registrado um aumento diário de 11,6% em seus acessos, liberou seu conteúdo “premium” para todo mundo. O site informou em suas redes sociais que o objetivo é colaborar para que os usuários fiquem em casa e impedir o avanço da contaminação do coronavírus.

Entre as produções “amadoras” os serviços Pantreon e OnlyFans, sites utilizados para comercializar vídeos e fotos eróticas ou pornográficas, também tiveram aumento significativo. Não apenas de assinantes, mas também de produtores de conteúdo que utilizam o site como uma alternativa de renda. A venda da própria imagem e do registro de suas relações sexuais seria uma saída em tempos de crise econômica e isolamento social?

Os sites pornográficos e os sites de exibição de câmera também se tornaram alternativas para profissionais do sexo. A quarentena reduziu a circulação de pessoas nas ruas e fechou casas noturnas, locais e territórios onde estas pessoas encontravam clientes. Muitas(os) buscam no sexo virtual ou na exibição online, alternativas para oferecer seu trabalho ou ganhar dinheiro neste momento de pandemia.

O próprio coronavirus virou uma categoria de busca nos sites pornô e o número de visualizações destes vídeos só aumentam. Para atender a demanda, produtores de conteúdo para sites como o PornHub já liberaram vídeos que mostram relações sexuais em situações de quarentena e utilizando acessórios e EPIs[1] que se tornaram essenciais neste período, como máscaras e luvas cirúrgicas.

Ao mesmo tempo que funcionam como produtos de entretenimento, a pornografia continua como um mercado poderoso e capaz de produzir, quase de forma fabril, conteúdo que será devorado por todos os tipos de pessoas e de desejos, assim como ressignificar questões como privacidade, trabalho sexual, relação sexual e vínculos humanos.

Paul Preciado, ao pensar o regime farmacopornográfico[2], já havia nos alertado para o controle e a produção do corpo desejante, através da pornografia, e a implementação em escala global das novas técnicas de produção de prazer.

Os aplicativos de “pegação” direcionados para homens gays cisgêneros[3], utilizados para encontros e para relacionamentos, emitiram comunicados aos seus usuários informando sobre os cuidados que cada um deve ter por conta do coronavírus. Grindr, Hornet e Scruff alertavam para a permanência em casa, reforçando as orientações da OMS e da Secretaria Estadual da Saúde.

A mesma Organização Mundial de Saúde (OMS) que orientou o isolamento para conter o Covid-19 também já definiu que para uma boa qualidade de vida, é necessário manter em equilíbrio quatro fatores fundamentais: família, trabalho, lazer e sexo. Sendo assim, mau-humor, irritação, baixa produtividade no trabalho e falta de disposição podem ser reflexos de uma vida sexual insatisfatória, no caso de pessoas alosexuais[4].

Neste momento, os efeitos causados pelo aumento no consumo de pornografia e relações sexuais a distância se torna fatores importantes para acompanhar e investigar, uma vez que poderão transformar as relações afetivo-sexuais daqui pra frente. Nos últimos anos, os vídeos pornôs já haviam se tornado objeto de estudo de psicólogos, sexólogos e terapeutas, uma vez que pesquisas mostraram dificuldades em excitação com parceiras(os) reais, baixa autoestima, além de percepções irreais de corpo e performance sexual.

[1] Equipamentos de Proteção Individual [2] Texto Junkie:Sexo, Drogas e biopolítica na era farmacopornográfica, 2018. [3] Pessoa que se identifica com a identidade de gênero que lhe foi atribuída no nascimento. [4] Pessoas que experienciam atração sexual ou não se encontram no espectro assexual.

Postado originalmente em 01/04/2020.

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